terça-feira, fevereiro 20, 2007

No Estreito de Breves


Dez de fevereiro. Meio da tarde. Debruçadas na grade do convés do Santarém, acompanhávamos atônitas as manobras que Giovan, 9 anos, e Jailson, 11, faziam para abordar, com sua pequena canoa, o nosso barco.
Aproximaram-se corajosos, prenderam um gancho de ferro na lateral do barco, passaram uma corda. Pronto! Já estavam navegando conosco. Jailson subiu ao barco e tratou da amarração, enquanto Giovan permaneceu no barco. Com uma força insuspeitada para um garoto de seu porte, Giovan sustentava a corda que prendia a canoa ao barco. Abaixo deles, a água rugia... Cena emocionante! Ana e eu fotografávamos entre lágrimas.
Terminada a operação de abordagem, os garotos subiram ao barco para vender os produtos que traziam na canoa: cacau, ingá e pupunha. Venderam tudo. Posaram para fotos, ganharam uma mochila velha, roupas.
Acompanhei o momento da contabilidade: o produto das vendas somou R$ 9,00.
Nossos piratinhas do século XXI passaram algumas horas no barco. E nem vimos quando nos deixaram...
Como eles, outros tantos barcos nos abordaram. Mais de dez. E outros mais, que não conseguiram agarrar o barco.


Vendiam palmito, pupunha, banana, cacau, cupuaçu, açaí. Arriscavam suas vidas para ganhar tão pouco!
Um a um, foram nos deixando. Quando a última canoa partiu já era noite.
Outro triste espetáculo era o das crianças e mães, habitantes das casinhas à margem do estreito, que remavam até perto do barco, enfrentando a enormidade do Amazonas agitado pelos motores do nosso barco, para pedir roupas. Já esperávamos por isso e tínhamos destinado quase toda a roupa que usáramos até então para esse momento. Comovidas, ainda na última hora despimos algumas peças para atirar aos canoeiros-mirim. Havia pessoas no barco que traziam sacolas e mais sacolas de roupa para jogar ao rio. As ofertas eram acondicionadas em sacos plásticos que eram atirados ao rio. Os canoeiros os recolhiam.


E esse pede-e-joga se estende por muito tempo.
Ainda no dia seguinte, enquanto aguardávamos o café da manhã, alguns passageiros atiravam aos moradores roupas e brinquedos retirados de um container vindo não se de onde.
Assim vivem alguns brasileiros.
Serão infelizes?
Ou os infelizes somos nós?
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Atualizado em 20/10/2014

5 comentários:

  1. Realmente emocionante! Lindas as fotos, lindo o texto...

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  2. aff... não ia comentar por aqui nada... ia ler tudo primeiro, etc e tal! Mas o que fazer se vc fez com que lágrimas saissem de meus olhos! a imagem das mães e crianças remando para pegar os sacos com roupas é demais pra mim...

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  3. Fiz o percurso de 5 dias entre Manaus e Belem de barco agora em janeiro 2011, e o que mais marcou-me nesta viagem, foram estas pessoas, principalmente crianças sacudindo os bracinhos e soando um huhuhuhuuhuhuh (em coro - porque são muitas canoas, uma ao lado da outra) para ganharem alguma coisa. Uns com tantos e outros com tão pouco... nunca vou esquecer. Planejo voltar em 2012

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  4. Achei esta cena comovente. Viajei de Manaus até Belém em 2004 e presenciei isso.

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  5. Viajei em 2004 de Manaus a Belém, e presenciei a mesma cena. Me emocionou bastante. Eu soube que muitas pessoas que viajavam no barco, sabiam que iriam passar no Estreito de Breves e preparam presentes para eles, tipo: bolachas, roupas, brinquedos.

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